Há um erro vulgar de terminologia, velha confusão: terrina e paté. Nunca falei sobre isto por me parecer minudência, mas hoje a confusão complicou-se mais num escrito de Hugo Campos, na Pública. Ou, erro meu, não o percebi bem, admito, porque HC não é um desconhecedor, como bem vejo pela minha leitura regular, sempre com agrado e proveito.
Diz que “terrine (ou terrina) é o nome francês dado a uma forma funda - com tampa, refractária e geralmente de cerâmica - [JVC: já agora, geralmente oval] e aos pratos nela preparados. Há quem confunda terrine com patê, talvez porque o clássico foie gras é confeccionado na terrine e, no final da cozedura, a consistência se assemelhar à de um patê. No entanto, pode preparar-se terrine com qualquer ingrediente, como legumes, que não será necessariamente patê.”
Não é bem assim. O que escreve sobre a terrina está correto, mas fica por aí. A confusão com patê (bom aportuguesamento de “paté” com “é”, em francês) parece vir, neste escrito, da ideia de que patê é só de fígado, aves ou carnes, ao contrário do que pode ser uma terrina. Ou de que patê tem a ver especialmente com “foie gras”. E não percebo o que é isto de o "foie gras" cozinhado numa terrina ficar com consistência de patê. O que é consistência de patê? Não é confusão, por analogia, com "pasta"? Ou não será que se está a pensar naquilo que qualquer pessoa vê no supermercado, umas fatias de uma pasta de fígado, pato, porco, com ou sem cogumelos ou pimenta verde, embrulhada em plástico e chamada de "patê"? Não quero crer, um gastrónomo como HC não pode induzir os leitores em tal erro. Devo estar a ler mal, repito.
Anote-se também que o “foie gras” tanto pode ser assado (melhor, cozido em banho-maria no forno) numa terrina, como diz HC, como, talvez mais frequentemente (e melhor, para meu gosto), frito a temperatura moderada em gordura (de ganso), ao lume ou, melhor ainda, braseado/salteado na sua própria gordura destilada ao aquecer controladamente na frigideira.
Anote-se também que o “foie gras” tanto pode ser assado (melhor, cozido em banho-maria no forno) numa terrina, como diz HC, como, talvez mais frequentemente (e melhor, para meu gosto), frito a temperatura moderada em gordura (de ganso), ao lume ou, melhor ainda, braseado/salteado na sua própria gordura destilada ao aquecer controladamente na frigideira.
A diferença essencial entre terrina e patê, seja do que for, tem a ver com outra coisa muito diferente, bem indicada pelo nome patê. Este é um preparado de uma pasta/recheio, em geral de carnes, envolvida com massa e cozinhada no forno, a temperatura relativamente alta, sem ser a banho-maria como a terrina. Quem for a um restaurante parisiense, mesmo que mediano, sabe logo, ao ler a ementa, se vai comer “la terrine du chef” (a minha, sem ser de chefe, vem no meu livro) ou “le paté du chef”, que até podem ter exatamente a mesma mistura de carnes mais ou menos moídas.
NOTA - Dito isto, mais importante são as receitas que acompanham o artigo. Mas cuidado: uma terrina exige muita prática, acerto na consistência final da pasta crua, grande domínio do forno (e do arrefecimento, com o peso certo em cima!); não é só ler uma receita e ficar com a certeza de sucesso! Não aconselho fazer pela primeira vez para um jantar de amigos exigentes.
Sem comentários:
Enviar um comentário