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terça-feira, 19 de abril de 2016

Oh!, coisas simples!

Comi hoje ao almoço, muito saudavelmente, peixe cozido. Parecendo que não, justifica algumas notas.
O peixe foi abrótea, um peixe desconsiderado cá, mas aquele a que, desde miúdo açoriano, me habituei. É certo que o que aqui se vende, do Atlântico Norte (onde?), provavelmente com dias de refrigeração, fica longe da abrótea açoriana, a lascar, excelente para cozer e para filetes. Não há turista que venha dos Açores e que não fale dos filetes. Não têm nada demais, só a abrótea bem fresca.
Peixe cozido? Em tempo de grande predileção pelos grelhados? Claro que gosto de peixe grelhado, mas tem de ser um peixe não espesso (não vou no peixe escalado). Todavia, isto não devia fazer esquecer tudo o excelente resto: peixe cozido, frito, assado. Mesmo a caldeirada, se bem que de peixes menores. Por exemplo, sou, também pelas raízes, grande apreciador de garoupa, mas fico estarrecido quando só a fazem como postas grelhadas. Já fritaram uma posta de garoupinha?
Peixe assado ainda há dias fizemos. Ou melhor, fez a morena, que é especialista, com uma receita mais rica do que a tradicional portuguesa que faço. Digo faço, hoje, porque a minha tradição é a do peixe assado em receita de família, invulgar, que vai no fim.
Coisa elementar que muita gente desconhece é que nunca! se coze peixe (incluindo bacalhau) em água a ferver. Deixa-se ferver a água, introduz-se o peixe e deixa-se voltar a fervilhar. Apaga-se o lume, tapa-se a panela e deixa-se cozer, escaldando, durante 5-7 minutos conforme o tipo e quantidade de peixe. No caso do bacalhau, escorre-se e imcuba-se meia hora em leite acabado de ferver.
Gosto muito de peixe ao vapor, com um caldo de legumes (neste caso sou pouco exigente e uso a geleia da Nestlé, mas não o cubo), vinho branco, um pouco de azeite, chalotas ou alho, louro, ervas da minha horta de varanda (salsa, tomilho, estragão, cerefólio), pimenta da Jamaica, sumo de limão. No fim, muitas vezes engrosso o caldo, coado, com gema de ovo, como se faz com o “court bouillon” da truta “au bleu” (outra das minhas coisas "simple things, how good!").
Fazia o peixe ao vapor no lume, na peixeira. Atualmente, meu novo vicio, faço na Bimby. Os ingredientes do caldo no copo. Na varoma, batatas e feijão verde. 15m/varoma/vel. 1. Se brócolos, primeiro só as batatas, 10 minutos e depois os legumes, 5 minutos. A seguir, em qualquer dos casos, colocar o tabuleiro, com o peixe e mais 15m/varoma/vel 1.
Finalmente o tempero. Ou o caldo engrossado ou o simples azeite e vinagre, com flor de sal e pimenta preta e branca misturadas e moídas no momento. Há muitos gostos para azeite e vinagre. O meu vai para o virgem extra da cooperativa de Vila Velha de Ródão, habitual oferta de um bom compadre, e o vinagre de tinto Moura Alves, que se vende na loja gourmet do Corte Inglês.
E cá vai a receita prometida, invulgar e subtil de elegância de sabores, coisa de família que não é de tradição regional açoriana. A cozinha era uma religião na família da minha avó materna, Adélia. Um dia destes, publico o seu livro de receitas, herdades ou criadas por ela, manuscrito pela minha mãe. Com a minha avó aprendi que a cozinha é arte e criatividade, compromisso equilibrado entre respeito pelo tradicional clássico e o moderno.
Em princípio, o peixe usado era a bicuda, que não há cá, uma variante de mares frios da barracuda, e mais pequena. Mas pode ir com os nossos peixes para assar, pargo, imperador, goraz, cântaro, garoupa, corvina.
Para 4 pessoas. 1 bicuda grande, 4 c. sopa de azeite, 4 c. sopa de vinagre, 4 c. sopa de banha, 1,5 c. sopa de farinha, 2,5 dl de caldo de peixe, 18 nozes, 125 g de azeitonas pretas, sal e pimenta. 
Untar uma assadeira com azeite e colocar o peixe, com uns cortes no lombo e temperado com sal e pimenta. Cobrir com o molho, feito com o azeite, o vinagre, a banha, a farinha diluída no caldo de peixe, tudo bem misturado, mais o miolo das nozes esmagado grosso e as azeitonas. Assar a 180º, regando com frequência o peixe com o molho misturado à colher. Servir coberto com o molho apurado, com uma guarnição a gosto (tradicionalmente, na família, batatas salteadas ou puré de batata com azeitonas pretas). 
Minha variante: Juntar ao molho uma redução forte, muito concentrada e coada, de 2 dl vinho branco com chalotas, salsa, cerefólio, cebolinho, estragão e pimenta da Jamaica, com uma pequena casca de limão. A minha avó gostaria de ver as minhas variantes. Ela estava sempre a experimentar.
(Há na minha família quem me rogue pragas quando divulgo “segredos”. Mas que maior homenagem posso prestar a essa herança senão divulga-la? E, no meu livro, há um capítulo dessas excelentes e bizarras – porque invulgares e de tom parisiense – receitas de família).

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Peixe assado, da tradição portuguesa

Comprometi-me com a receita da semana. Em princípio, seria ou coisa inventada no fim de semana ou coisa da enorme lista de invenções ainda não publicadas. Afinal, não vai ser receita minha, vai ser coisa mais que clássica, mas a recomendar-se em bom nível de técnica, um peixe assado à tradição portuguesa. Até porque vem na sequência de um “post” anterior. E perguntando: em que restaurante ainda encontram peixe assado?
Assim, porque a morena - e eu a ver - se esmerou num pargo assado à boa maneira portuguesa, vale a pena registar receita banal, dela e da sua infância com ligeiro toque meu, mas talvez muito esquecida. Mais, com indicação dos truques.
2 pargos pequenos (cada um para uma pessoa). 1 cebola grande, 4 dentes de alho, 1 folha de louro, 1 tomate bem maduro, 2 c. sopa de polpa de tomate, 1 c. sopa de massa de pimentão, 2 dl de vinho branco, 4 c. sopa de azeite, 1 raminho de salsa, 2 hastes de poejo, sal, pimenta preta e branca (1:1), 4 grãos de pimenta da Jamaica. 300-400 g de batata.
Anote-se que, em relação ao uso da morena e também da minha tradição familiar, eu acrescentei, à açoriana, a Jamaica e, a meu gosto e acho que muito bem, o poejo (para a próxima, experimentarei hortelã da ribeira). Outra “asneira”, ao contrário da receita, é que, dieteticamente incorreto mas a lembrar-nos a infância, usamos óleo em vez de azeite. No nosso tempo, nos Açores ou em Angola, azeite era coisa cara, só para temperar peixe cozido e saladas.
Dar dois golpes na diagonal ao peixe, de cada lado e dispor numa assadeira, com espaço à volta. Cobrir com a cebola às meias luas, o alho, o tomate aos cubos pequenos, as polpas, as ervas, os temperos. Preencher o resto do espaço com as batatas aos cubos, sem passar para cima do nível de altura do peixe. Molhar com o vinho e o óleo/azeite e levar ao forno pré-aquecido a 200º. Assar a esta temperatura, cerca de 30-40 minutos, vigiando com frequência e passando para cima algumas colheres de molho.
Importante é quando tudo começa a crestar e o molho bastante diminuido. É altura de o tomate assar semi-seco e de as batatas assarem em vez de cozerem. Subir ao máximo a temperatura do forno, a tostar tudo muito bem, durante cerca de 10 minutos, molhando com uns pingos de água de dois em dois minutos. No fim, com as batatas bem assadas, a cebola bem dourada, juntar água suficiente para aumentar o molho, sem o diluir.
Afinal, vale ou não a pena divulgar uma receita tradicional, banal, mas que pode exigir alguma técnica? Exigir que a morena ainda hoje sinta o cheiro e os sabores da cozinha da avó?