Mostrar mensagens com a etiqueta massa tenra. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta massa tenra. Mostrar todas as mensagens

domingo, 11 de setembro de 2011

A massa já é universal

É legítimo mudar as receitas consagradas? Creio que sim quando essas receitas deixaram de ser parte de um património regional e nacional e passaram a exemplos de globalização culinária (infelizmente, muitas vezes não gastronómica). Alguém pode ser impedido de inventar o seu hambúrguer ou a sua pizza e chamar-lhe assim?
Um bom exemplo são as muitas massas italianas. Não concordo com que se desrespeitem designações consagradas, à bolonhesa, à carbonara, à putanesca, à arrabiata, etc. Diferente é o caso de ingredientes diversos, dezenas e dezenas, que por toda a Itália se juntam a massas, sem que isto defina um prato típico. Um exemplo de coisa minha muito apreciada é massa com amêijoas (“pasta con vondole”).
Já a comi em Itália de muitas maneiras, desde quase simples e sem molho até um pouco atomatada ou, como agora na Sicília, como não podia deixar de ser, com anchovas. Não me parecendo que haja uma receita única, consagrada, dou-me ao luxo de ter a minha receita de esparguete com amêijoas (também podia ser outra massa - lembro-me de que a primeira vez que comi, em Roma, há largos anos, foi com “penne”). Foi o que fiz hoje ao almoço.

domingo, 30 de janeiro de 2011

Pastéis de massa tenra (II)

Afinal, mudei de ideias, depois de evocações mútuas de infância e do gosto de tentarmos recordar e refazer memórias antigas que já não temos quem no-las transmita com inteira segurança. Como disse, temos ideia de que, em ambas as casas, croquetes e pastéis de massa tenra se faziam com os restos de carne assada, quando não apetecia comê-la outra vez da mesma forma ou quando o molho já se tinha ido.
Anote-se que “carne assada”, em ambas as famílias, tão distantes geograficamente, era de facto carne estufada, na panela. Da minha tradição, publiquei a receita em “O gosto de bem comer”, pág. 278. Quanto ao seu derivado recheio de pastéis, a ideia que temos é de que era praticamente só a carne, moída, a ficar granulada, ligada com um pouco de molho a dar sabor, e uma pequena liga de farinha e leite. "Se non è vero, è ben trovato".
À falta de informação segura, resolvemos fazer o mais simples, de que não tínhamos dúvidas, e com que também concordou um dos meus irmãos, aquele que mais longamente acompanhou a culinária familiar. A peça de vitela (alcatra) foi estufada de véspera, como descrevi no livro: a carne bem estalada em margarina dietética (devia ser óleo, mas a minha dietista é minha leitora…), acrescentada de bastante cebola aos gomos e da vinha-de-alhos em que ficou. Esta não ficou, foi decidida à última da hora, por isto levou os temperos para o estufado: alho, vinho branco, um pouco de vinagre, louro, salsa, tomilho, sal, pimenta preta, pimenta da Jamaica.
O recheio (em dose para 4 pessoas) foi simplesmente esta carne, 500 g, moída no velho moinho de carne (não na misturadora de lâminas!), embebida em 2 c. sopa do molho do assado, muito apurado, polvilhada com 2 c. sopa de farinha e bem mexida, incorporando-se depois 6 cl de leite. Parece que, na minha casa de família, quando os restos de carne já não tinham molho, se começava por saltear a carne moída num pouco de refogado de cebola picada muito fino (pouca quantidade, só a dar sabor e a engordurar um pouco). 
Claro que não se justifica todo este trabalho para fazer simples pastéis de massa tenra ou croquetes. Foi só uma brincadeira, de rememoração. Para o dia-a-dia, sugiro que experimentem o recheio descrito no “post” anterior. Como acabei por não experimentar, digam depois de vossa opinião.

Confesso que violei parcialmente a minha dieta. Já que estávamos em experiência, metade dos pastéis foram ao forno, como escrevi na entrada anterior, metade foram fritos, como manda a tradição. Os assados ficaram muito bons e recomendam-se dieteticamente, mas os fritos sempre fazem diferença!...

Nota - Dose para quatro pessoas para só duas comerem? É que já ficou recheio para outra experiência, os croquetes com a mesma lógica, de carne previamente cozinhada. Claro que o recheio vai levar pequenos ajustamentos.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Pastéis de massa tenra

Nas nossas conversas conjugais e gastronómicas de jantar de fim de semana, em que me esmero, chegamos sempre à conclusão de que temos experiências muito comuns, afinal da velha cultura gastronómica portuguesa, na variante burguesa, citadina, mesmo que de um lado e outro da linha equatorial. Vem isto a propósito de coisa muitas vezes lembrada, uma banalidade esquecida, mas que para ambos é uma grande memória das avós, os pastéis de massa tenra. Vem isto de hoje ter comido um, horroroso. Domingo vou-me desforrar. Amanhã não, porque já há outro programa, que logo verão.
A minha avó materna pontificava na cozinha, enquanto a minha mãe professava (salvo seja, quero dizer, trabalhava como professora). Por isto, a minha herança culinária é Fagundes, praiense, terceirense, mas com assimilação de muitas coisas boas, de raiz micaelense, da minha avó paterna, lado Viveiros. Entre elas, o polvo e o molho de fígado, famosos nas Capelas e redondezas, incluindo S. Vicente do retiro filosófico do meu querido amigo Jorge. E também os pastéis de massa tenra, que a tradição de família diz se deverem a uma esquecida criada Piedade.
Se a quiserem fazer, e não é nada difícil, aqui vai a minha receita familiar, afinal a geral mas com pequenos truques. 250 g de farinha, 4 c. sopa cheias (50 g) de banha, 1 dl de água, sal, um pouco de açúcar, a gosto. Se se quiser aligeirar, usar banha e manteiga, 2:1. Desde logo, na receita, como toque de diferença de receita familiar, a banha em exclusivo e o açúcar. Faz-se como uma massa quebrada, mas deve ser mais amassada, com o ponto importante de, no fim da mistura, se juntar parte da água muito fria. Depois, como em regra, embrulhar num pano e deixar repousar uma hora, no frigorífico. Também se trabalha a meio caminho como massa folhada, estendendo e dobrando, duas vezes (claro que sem juntar gordura).
O recheio, na minha casa e na da morena, era um moido de restos de carne assada ou guisada, refogada. Se não, com carne crua, compensar em temperos. Aqui vai uma sugestão, de compromisso.
500 g de carne de segunda (aba, acém, cachaço, chambão), 1/2 cebola, 1 dente de alho, 2 c. sopa de manteiga ou de margarina dietética, 2 c. sopa de farinha, 5 cl de vinho branco,  5 cl de leite, sal, pimenta preta moída a fresco, pimenta da Jamaica bem esmagada, tomilho a gosto, 1 raminho de salsa, atado.
Refogar a cebola e o alho, muito picados, com o louro. Juntar a carne moída em moinho de furos (!) e voltear bem, até bem alourada. Polvilhar com a farinha, até bem incorporada e alourada. Temperar e misturar o líquido, ferver a lume baixo deixando espessar muito grosso, mexendo sempre muito bem para não pegar ao fundo. Juntar goles de água, aos poucos, se necessário. Retirar o louro e a salsa. Estender muito bem a massa, cortar círculos grandes, rechear, fechar os pastéis, pincelar com gema de ovo e levar ao forno (pré-aquecido!), a 190º, 20-25 minutos. Deixar reduzir à temperatura de servir, no forno apagado, com a porta um pouco entreaberta.
O meu alter ego culinário, D, recomenda-me coisa que nunca fiz, mas que talvez fique muito bem. Reserva um pouco da carne, crua, para moer fino em misturadora de lâmina e acrescenta ao refogado de carne e à farinha, antes de prosseguir com a adição de líquido. Diz que a mistura de ambas as carnes resulta cremosa/granulada sem ficar borracha como se come por aí.

(Editado, 30.1.2011)